Quarta-Feira, 18 de Junho de 2025
Brasil
03/04/2014 06:00:32
Bairro teme se descolar do Brasil e virar parte da Bolívia
Cidade de Brasileia, no Acre, teme perder a ligação terrestre com o resto do município e tornar-se uma ilha cercada pela Bolívia

BBC Brasil/PCS

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A acelerada erosão nas margens do rio Acre, na divisa entre as duas nações, está perto de fazer com que parte da cidade de Brasileia, no Acre, perca a ligação terrestre com o resto do município (Foto: Ascom/Acre)
Com suas fronteiras definidas há mais de um século, o Brasil pode\n em breve perder parte de suas terras para a Bolívia - ou, pelo menos, é o que\n temem os moradores de uma cidade brasileira na fronteira com o país vizinho.\n \n A acelerada erosão nas margens do rio Acre, na divisa entre as\n duas nações, está perto de fazer com que parte da cidade de Brasileia, no Acre,\n perca a ligação terrestre com o resto do município, tornando-se uma ilha\n cercada pela Bolívia.\n \n A Bolívia jamais manifestou interesse pelos bairros de Brasileia\n que podem ficar ilhados, mas isso parece não tranquilizar alguns moradores\n inquietos. "Vamos ter que virar tudo boliviano", diz à BBC Brasil\n o comerciante e líder comunitário João Oliveira Magalhães, um dos 2 mil\n moradores da área, que abrange os bairros de Samaúna e Leonardo Barbosa.\n \n Magalhães, de 61 anos, mora com a esposa e um de seus onze filhos\n no trecho mais vulnerável à erosão, a cada vez mais estreita faixa de terra que\n liga os dois bairros às demais partes de Brasileia. "O rio está comendo\n muita terra, o barranco está no toco."\n \n Os bairros - habitados por cerca de 500 famílias pobres - foram\n erguidos num meandro, um trecho sinuoso do rio. Meandros são bastante sujeitos\n a mudanças de curso por causa de chuvas ou de ações humanas.\n \n Magalhães afirma que, se os bairros perderem a ligação com o\n resto da cidade, a Bolívia reclamará a área, já que ela se tornaria quase um\n enclave brasileiro na cidade boliviana de Cobija. "Na minha experiência,\n não vão dois anos para apartar o lado que vai ficar para a Bolívia. O Brasil\n vai perder muita terra".\n \n Segundo um estudo do engenheiro Oscar Martins, da Universidade de\n Santa Maria (RS), o trecho que liga os bairros ao resto do município perdeu 15\n metros de largura entre 1997 e 2008.\n \n Desde então, segundo a prefeitura, ele continua encolhendo. Em\n 2013, a faixa media 20 metros de largura e, na semana passada, após uma forte\n chuva, reduziu-se para 18 metros. O último deslizamento, diz Magalhães, deixou\n dependurado o bar que ele mantém no fundo de sua casa, à beira do rio.\n \n O temor de que a Bolívia reivindique a área ecoa rivalidades\n históricas. O território que hoje é o Acre pertenceu ao país vizinho até 1899,\n quando seringalistas brasileiros que o habitavam iniciaram uma revolta contra\n autoridades bolivianas.\n \n Vitoriosos, eles chegaram a declarar uma república independente,\n até que, em 1903, o Barão do Rio Branco assinou com a Bolívia o Tratado de\n Petrópolis, que garantiu o domínio brasileiro sobre a área.\n \n Apesar dos temores, porém, a Bolívia jamais manifestou interesse\n pelos bairros de Brasiléia que podem ficar ilhados. E segundo o Ministério de\n Relações Exteriores do Brasil, a fronteira entre os dois países não está\n sujeita a variações do curso do rio Acre.\n \n Em nota à BBC Brasil, o órgão diz que recentemente\n Brasil e Bolívia definiram novos marcos fronteiriços na área do meandro. O\n Itamaraty afirmou ainda que o Exército, a Agência Nacional de Águas e a Defesa\n Civil estão se coordenando "para adotar as providências necessárias à\n contenção do processo erosivo" no local.\n \n No entanto, segundo o prefeito de Brasileia, Everaldo Gomes\n (PMDB), "no momento não existe uma solução para o problema". Ele diz\n que a obra de contenção está na fase de estudos e que viajará em breve a\n Brasília para tentar acelerar o processo.\n \n "A liberação de recursos é difícil. Nosso medo é que na\n próxima enchente o bairro fique isolado." Nesse caso, afirma o prefeito, a\n saída será construir uma ponte. Gomes diz que, sem o dinheiro federal, a\n prefeitura de Brasileia não tem o que fazer, por já estar sobrecarregada.\n \n Imigrantes
\n Há alguns anos, a cidade, de 22 mil habitantes, passou a abrigar milhares de\n imigrantes - em sua maioria haitianos - que têm entrado no Brasil pela\n Amazônia, após longas viagens por terra desde o Equador. Segundo o governo do\n Acre, há hoje na cidade 2.500 imigrantes, ou 11% da população local.\n \n Enquanto as autoridades adiam a solução para o problema à beira\n do rio, o morador João Oliveira Magalhães passa os dias de olho nas águas do\n Acre.\n \n Ele propõe outra solução para o impasse - uma que, em suas\n palavras, respeitaria "a vontade do rio": que os governantes\n construam casas para os moradores em outro ponto da cidade. Dessa maneira,\n ninguém correria o risco de ficar isolado ou de ser arrastado por\n deslizamentos.\n \n Desde que mora ali, Magalhães afirma que o rio "comeu"\n 15 metros de largura do terreno de sua casa. "Não conseguimos mais dormir\n pensando que o rio pode nos levar. A água está quase chegando".\n \n \n
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