G1/AB
ImprimirO Ministério da Educação (MEC) apresentou nesta terça-feira (3) a segunda versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). O documento tem a meta de determinar conteúdos mínimos que os alunos das 190 mil escolas do país terão que aprender a cada etapa da educação básica.
A BNCC é considerada fundamental para reduzir desigualdades na educação no Brasil e países desenvolvidos já organizam o ensino por meio de bases nacionais. A proposta preliminar foi feita por uma comissão de 116 especialistas de 37 universidades de todas as partes do Brasil e gerou polêmica por causa das lacunas deixadas em áreas como história e literatura.
As revoluções Industrial e Francesa, por exemplo, e a história das civilizações grega e egípcia não constavam no texto. O mesmo acontecia com a literatura portuguesa, que não aparecia no conteúdo programático. Segundo o MEC, as falhas foram preenchidas na versão nova.
Contribuições e próximos passos O documento preliminar da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) foi apresentado em 16 de setembro de 2015. Ele ficou disponível para envio de sugestões até 15 de março e recebeu mais de 12 milhões de contribuições de instituições, educadores e público em geral.
O prazo final para que o documento final esteja pronto e aprovado é junho de 2016. A segunda versão da BNCC precisa agora ser submetida a seminários nas redes estaduais e municipais de ensino. Depois disso, a partir das contribuições dos seminários será elaborada a versão final que será, enfim, discutida e votada no Conselho Nacional de Educação (CNE).
"Estamos na segunda versão, não é a versão final. Essa versão soube dialogar e construir um grande avanço em relação à primeira, especialmente nos temas mais sensíveis", afirmou o ministro da Educação, Aloizio Mercadante.
Mudanças incorporadas O ex-ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, afirmou que a maior parte das críticas feitas ao documento foi incorporada à nova versão: ele relembrou, por exemplo, que até mesmo o atual ministro Mercadante havia se queixado da falta de conteúdos sobre gramática na área de Linguagens, em língua portuguesa.
Também citou as discordâncias que surgiram em relação à falta de literatura de Portugal na proposta curricular – ambas as observações foram consideradas. “É fabuloso vermos contribuições tão grandes na educação”, afirma Janine.
O ministro Mercadante ressaltou que a segunda versão resolve falhas no conteúdo de Linguagens. "A escrita, a leitura, a oralidade e a língua culta estão mais bem articuladas nessa nova versão, inclusive com o resgate da Literatura Portuguesa", disse o ministro.
Sobre o conteúdo de história, Mercadante também ressaltou avanços e admitiu que a disciplina é um espaço de disputa. "A história sempre será um espaço de disputa, a interpretação de cada fato histórico", disse, afirmando na sequência que há espaço para convergência.
"Evidente que precisamos dar ênfase à História Clássica, ao nosso pertencimento no Ocidente. O que não é possível é, no meio dessa indispensável reflexão sobre nossa inserção no mundo, abdicar de abrir espaço para discutir o que já é lei e é direito. Nós temos 174 línguas indígenas nesse país. Temos o terceiro país de maior diversidade étnica e racial do planeta, e essa cultura não tem tido espaço nas salas de aula", disse Mercadante.
História: a polêmica nas Ciências Humanas O professor Marcelos Burgos, da PUC-RIO, que representou a área de Ciências Humanas na apresentação dos destaques da nova versão, disse que o conteúdo de história sofreu mudanças e manteve conquistas da nova abordagem, que considera um "salto de qualidade".
“O mais importante a falar da história é que, ao mesmo tempo em que avança para evitar o viés eurocêntrico, ela consegue valorizar a história da África, o protagonismo das culturas indígenas e afro-brasileiras, mas sem abrir mão dos processos históricos do Ocidente e do Brasil”, disse o assessor da BNCC para a área de Ciências Humanas e professor da PUC do Rio, Marcelo Burgos.
Ainda segundo Burgos, nos anos iniciais da educação, houve uma integração maior entre as disciplinas de geografia e história e, nos finais, o destaque na ênfase à formação sociocultural e territorial do Brasil.
Sobre o ensino médio, Burgos considera que é a segunda versão é “um momento definitivo de incorporação da sociologia e filosofia na educação básica”. Segundo o professor, isso representa o enriquecimento da capacidade de contato entre diferentes culturas pelo aluno. Por fim, o professor destacou que o ensino religioso, que aparecia inicialmente dentro das Ciências Humanas, agora é apresentado como uma área isolada.
Retorno da gramática e da literatura portuguesa De acordo com os envolvidos na revisão do conteúdo de português, a partir das contribuições não houve dúvidas sobre a necessidade de tornar presente os temas gramática, literatura e "o que ler na sala de aula". No caso da gramática, houve solicitações específicas para manter a gramática presente a partir do 6º ano.
Segundo os revisores, para atender as demandas foi incluído um novo "eixo organizador dos objetivos de aprendizagem" no documento da segunda versão da BNCC. Ele prevê etapas mais específicas sobre o conhecimento da língua e sobre a norma padrão (regras, usos e gramática normativa).
Outra polêmica envolveu o que ler e quando ler, sobretudo no ensino médio. Os professores cobraram - através da consulta pública - a inclusão da literatura regional, autores brasileiros e estrangeiros contemporâneos, além de cobrar especificamente a presença da literatura portuguesa. Na 2ª versão, os professores responsáveis pela revisão dizem ter contemplado essas contribuições, embora digam que optaram por não nomear autores, mas indicar parâmetros para o uso dessas referências.
Matemática: detalhamento de conteúdos De acordo com professores que participaram do processo, o trabalho de revisão buscou dar mais clareza para os conteúdos e objetivos de aprendizagem. Segundo o professor de matemática Marcelo Câmara, os docentes que enviaram contribuições através da página da Base na internet pediam clareza e proximidade do conteúdo com o dia dia da sala de aula. De acordo com ele, a proposta ganhou detalhamento que atenderam as demandas dos professores.
Ciências da Natureza A professora Edenia Maria do Amaral, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, ressaltou que a principal mudança em ciências da natureza é especificar com mais clareza os objetivos de cada item da proposta curricular.
Foram pensados, de acordo com ela, temas que exijam demandas cognitivas maiores e menores. “Diversificamos os estudos das ciências no ensino fundamental”, afirma. Ela também ressaltou a importância de haver relação entre os temas abordados. “No ensino médio, fizemos uma proposta de unidades curriculares que abra a possibilidade de fazer arranjos flexíveis entre elas”, explica.
Críticas necessárias Para o secretário estadual de educação do Amazonas, Rossieli Silva, a primeira versão do documento foi fundamental para o debate sobre os rumos da educação no país. “A primeira versão foi muito importante porque recebeu muitas críticas e através delas chegamos a um documento muito mais forte e com a cara da sociedade brasileira”, afirmou
Em seu discurso, o ministro da educação Aloizio Mercadante destacou o método de construção da Base Nacional Comum Curricular, feito em conjunto com universidades, entidades científicas e professores. “Aqueles que estão comendo pó de giz têm o direito de comentar e interferir. O portal foi feito para assegurar que aqueles que fazem a educação no dia a dia pudessem participar dessa construção”, afirmou. Também citou a transparência e liberdade de opiniões do processo.
Sobre o documento, afirmou que a segunda versão “soube dialogar e construir um grande avanço em relação à primeira”, estabelecendo uma melhor divisão na educação infantil e estímulo ao questionamento e pesquisa nas ciências da natureza. "Na educação infantil, estabelecer e articular as três faixas etárias foi fundamental para esse entendimento, que não estava bem construído na primeira versão", disse Mercadante.