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ImprimirApós a morte de um rapaz de 25 anos durante realização do teste físico de concurso da Polícia Militar de Mato Grosso do Sul, um projeto que regulamenta horários específicos para este tipo de avaliação foi apresentado e gerou debate na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul. A proposta prevê que as provas físicas não sejam realizadas no período da tarde, quando o tempo seco e o calor estão no pico.
Arthur Matheus Martins Rosa, de 25 anos, passou mal durante a corrida de 2,4 quilômetros na última quarta-feira (2) e morreu na madrugada do dia seguinte. Além dele, dezenas de outros candidatos passaram mal e sofreram desmaio durante o Teste de Aptidão Física.
Autor da proposta, o deputado estadual Pedro Kemp (PT) disse que os testes deve ser realizados em condições que não submetam os candidatos a situações de risco.
"Não podemos admitir que o TAF se torne um teste de sobrevivência para ver quem morre e quem sobrevive, não pode ser assim, tem que ser um teste para apurar se o candidato está em condições de realizar atividades no exercício da sua profissão, que vai exigir condições físicas adequadas", disse, na tribuna.
Kemp explicou que o projeto de lei estabelece que sejam discutidos critérios mínimos para garantir a participação dos candidatos em situações adequadas, como critérios mínimos diferenciados para homens e mulheres, disponibilização de ambulâncias para atendimento em casos de emergência, entre outros.
O ponto principal, no entanto, é o relativo ao horário. A proposta veda a realização do TAF entre as 10h e 16h.
"Nesse período o sol é mais intenso e o calor é excessivo", justifica Kemp. Ele afirma ainda que a proibição é para locais abertos, sendo liberada a aplicação do teste em locais fechados e climatizados.
"É preciso que essas condições sejam observadas. O jovem veio sonhando em ser policial militar em Mato Grosso do Sul, aí faz um teste e acontece essa tragédia. Ele trouxe atestado médico, não tinha comorbidade, já tinha feito outro teste porque era agente penitenciário em Goiás. É preciso que nosso estado dê exemplo para o Brasil, o teste deve medir aptidão física, mas não submeter o candidato a risco de morte, isso não podemos admitir", afirmou.
Além disso, ele defende que o teste em horários em que as condições climáticas estejam favoráveis garante a isonomia do concurso.
"O candidato faz a prova 6h e outro as 14h, não há isonomia. Uns passam e outros não, uns desmaiam e outros não. A questão a ser observada é que todos sejam submetidos aos testes nas mesmas condições, e não um de manhã no clima ameno e outro no sol escaldante da tarde", ressaltou.
Debate
O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Gerson Claro, pediu um aparte e disse que é preciso ouvir pessoas envolvidas na organização do concurso e demais candidatos antes de "condenar" a realização do TAF.
"Eu já fiz teste quando fui pro quartel e na época era pior, é em horário difícil justamente para saber se a pessoa tem capacidade de suportar a farda, o peso que ele tem que carregar. Então o horário é justamente para que aquela pessoa seja capaz de exercer o que está se propondo", disse Claro.
"Pode ter erro, mas vossa excelência [Kemp] fala de uma tragédia e temos que dar oportunidade de quem fez o teste se manifestar. Me preocupo muito com a condenação imediata de uma coisa que é considerada uma fatalidade", acrescentou o presidente da Casa.
Kemp respondeu dizendo que o intuito não é condenar os responsáveis pelos testes, mas prevenir que outras situações semelhantes não venham a ocorrer.
Com relação às atribuições do cargo de policial militar, ele afirma que é possível avaliar com testes menos arriscados.
"Uma coisa é se submeter a testes para medir sua capacidade física, agora o indivíduo ficar sem tomar água sete horas, sem se alimentar, já é uma situação problemática que precisa ser revista. Os testes podem continuar a exigir esforço físico, porém não submetendo a pessoa a um risco de morte, ficar sete horas sem se alimentar, sem tomar água e depois sair correndo num sol de 37°C é uma situação bastante arriscada", complementou.
O deputado Lídio Lopes (Patriota) concordou com Kemp e afirmou que há algumas situações que precisam ser repensadas.
"Muito mais do que candidatos aprovados em concurso público, nós precisamos poupar vidas, principalmente quando se trata da carreira da PM, que tem essa atribuição de cuidar de vidas e trazer segurança", disse.
"Fica um alerta para as comissões reavaliarem. O clima mudou, houve elevação da temperatura, temos um período de muita seca, a questão do ar está difícil, a questão respiratória, ainda mais depois de uma pandemia que a saúde do cidadão não é mais a mesma, eu fiquei cheio de comorbidade mesmo depois de dois anos, quiçá um jovem num calor escaldante no período de13h", acrescentou.
O deputado diz ainda que o período ideal é que o TAF seja aplicado no período da manhã e no fim da tarde, mesmo que se prolonguem os dias de realização do teste, para que as pessoas tenham oportunidade de testar a aptidão física sem levar ao sacrifício, desmaios e morte.
Por fim, Lídio exemplificou o caso de quando sua esposa, a prefeita Adriane Lopes (PP) realizou um TAF em concurso público quando estava gestante de seis meses.
"Ela teve que ser submetida ao mesmo teste, fez abdominais, faltou um abdominal e ela foi reprovada. [...] os regramentos exigem demais", disse, acrescentando que recorreu à Justiça, que garantiu que a agora prefeita refizesse o teste após o pós-parto.
Kemp concluiu o debate afirmando que o projeto ainda passará pelas comissões antes de ser votado na Assembleia, mas que espera apoio dos deputados para regulamentar as provas e evitar novas mortes.
"Sabemos que precisa comprovar que tem condições físicas de exercer a profissão, pois o policial vai passar por situações de risco, mas que não perca a vida no momento que está tentando ser PM", finalizou.
RELEMBRE O CASO
Arthur Matheus Martins Rosa, de 25 anos, morava em Goiás e estava na Capital apenas para participar do Teste de Aptidão Física (TAF) do concurso no qual era candidato. Ele desmaiou de exaustão durante a prova, foi socorrido, mas não resistiu e acabou morrendo.
Em vídeo divulgado é possível ver o candidato e outras pessoas caindo durante o percurso de 2,4 metros que deveria ser completado em 12 minutos. Além da corrida, o teste também incluiu barra fixa e 32 abdominais, sendo de caráter classificatório, ou seja, é preciso completar as três provas para que seja aprovado para a próxima fase.
Além de Arthur, outras pessoas passaram mal e criticaram a organização do concurso, já que a prova não estava sendo aplicada em ordem alfabética, mas sim, em ordem de chegada. Diversos participantes relataram que tiveram que aguardar mais de cinco horas para realizar a prova, sendo que o local de espera não era coberto e também não foi oferecida alimentação.
Mesmo após a morte e reclamação de candidatos, o teste continuou sendo aplicado nos dias subsequentes.