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“Infelizmente, na maioria das vezes, a gente acaba parando a correria da rotina e prestando atenção na saúde mental quando ela já está completamente afetada. Foi isso que aconteceu comigo”, conta Mariana (nome fictício), servidora pública, de 34 anos.
Após a pandemia, com o retorno ao trabalho presencial, a mulher passou a ter crises de ansiedade que, com o tempo, evoluíram para crises de pânico e ideação suicida.
“Eu nunca havia feito terapia, mas chegou um momento em que eu notei que realmente precisava de ajuda”, lembra a servidora, que faz sessões semanais de psicoterapia há quatro anos e não quis se identificar na matéria.
Nesta sexta-feira (10) é celebrado o Dia Mundial da Saúde Mental, data que alerta para a urgência do tema, que, para muitos brasileiros, assim como Mariana, se tornou uma prioridade na rotina.
População preocupada com saúde mental
De acordo com pesquisa divulgada pela Ipsos Health Service, 52% da população do país considera o bem-estar psicológico sua principal preocupação quando o assunto é saúde.
O relatório, que entrevistou a população de 30 países, apontou que, em termos globais, 45% das pessoas veem o adoecimento psicológico como um problema de saúde em sua nação, classificando-a à frente do câncer (41%) e da obesidade (25%).
O estudo compara, ainda, os resultados atuais com a última pesquisa, realizada em 2018, e relaciona o aumento dessa percepção à pandemia de Covid-19. A proporção de pessoas que veem a saúde mental como um problema cresceu 18 pontos percentuais, mundialmente, desde 2018.
O aumento da preocupação com a saúde mental também reflete o crescimento da preocupação com o estresse. De acordo com a pesquisa, 31% dos entrevistados o consideram um problema, e 59% afirmam que, em 2024, passaram por momentos em que se sentiram tão estressados que não conseguiram lidar com determinada situação.
Busca por ajuda
Para a psicóloga Denise Milk, a procura por atendimentos relacionados à saúde mental aumentou muito desde a era da Covid-19, especialmente por questões ligadas a tensões do ambiente de trabalho.
“As pessoas passaram a repensar o que significa produtividade, e muitas perceberam que estavam vivendo em um ritmo insustentável. O modelo de trabalho remoto, o retorno presencial e as constantes mudanças nas relações profissionais trouxeram novas formas de pressão e ansiedade”, aponta a profissional.
De acordo com Milk, o público feminino ainda é maioria na abertura emocional e disposição em buscar ajuda.
“Os homens, em muitos casos, ainda enfrentam barreiras culturais que os fazem esconder o sofrimento por medo de parecerem frágeis, o que acaba agravando os sintomas ao longo do tempo”, afirma.
A psicóloga diz notar, em seus atendimentos, desafios frequentes em cada etapa da vida.
“Entre os mais jovens, há uma consciência crescente sobre a importância da saúde mental, mas também um nível alto de cobrança e insegurança profissional. Já entre os adultos mais experientes, noto uma preocupação maior com a estabilidade e a dificuldade de se adaptar às novas formas de trabalho e à cultura digital”, explica.
Oferta de serviços
Com o crescimento da demanda por atendimentos psicólogos, é necessário aumentar também a oferta. A pesquisa da Ipson apontou que, no país, apenas 34% dos entrevistados afirmaram que o sistema de saúde é bom ou muito bom.
Entre os defeitos apontados pela população, o acesso ao tratamento e tempo de espera para procedimento foi o mais mencionado (43%), assim como a falta de investimentos (39%) e a baixa preocupação do sistema com saúde preventiva (34%).
De acordo com a 13ª edição do Relatório Saúde Mental em Dados, do Ministério da Saúde, o Brasil contava, em 2024, com 3.019 CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) em seu território.
A quantidade de estabelecimentos cresceu 65% nos últimos dez anos, com a criação de 810 novas unidades entre 2014 e 2024. O aumento, porém, é inferior ao registrado no recorte de 2004 a 2014, quando a quantidade de CAPS aumentou 265%, passando de 605 para 2.209.
No país, o indicador de CAPS para 100 mil habitantes é de 1,13. O número é apropriado para os parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde, embora seja registrada uma discrepância entre as regiões brasileiras. Enquanto no Nordeste o indicador chega a 1,28, no Norte o número cai para 0,79.
O que diz o Ministério da Saúde?
Procurado pelo R7, o Ministério da Saúde afirmou que a assistência para pacientes que buscam atendimento psicológico é oferecida por meio da RAPS (Rede de Atenção Psicossocial), que inclui CAPS, UPAs (Unidades de Pronto Atendimento), Prontos-Atendimentos e UBSs (Unidades Básicas de Saúde).
“Entre 2023 e 2024, o orçamento da RAPS cresceu R$ 650 milhões, o que representa um aumento de 40% em relação ao orçamento anterior — passando de R$ 1,6 bilhão em 2022 para R$ 2,25 bilhões em 2024. Essa variação reflete a habilitação de novos serviços e a recomposição do custeio dos já existentes, fortalecendo a rede em todo o país”, afirmou a pasta.
“Além da expansão da rede, o ministério investe em educação permanente para os profissionais do SUS, em parceria com instituições de ensino e pesquisa, visando qualificar o cuidado e fortalecer as equipes nos territórios”, completou.
O ministério não respondeu se a quantidade atual de CAPS atende a demanda da população ou se há planos de construção de novas unidades. O espaço para respostas segue aberto.