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Polícia
12/07/2018 19:03:00
Em um ano, PCC dobrou de tamanho em MS, aponta Gaeco
Facção reforçou atuação para não perder controle das fronteiras

CE/PCS

Bastou um ano para que o Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que controla o tráfico de drogas e armas nas fronteiras com Paraguai e Bolívia, ganhasse a marca de quase mil novos integrantes em atuação em Mato Grosso do Sul e dobrasse de tamanho no Estado.

É o que apontou o inquérito da Operação Echelon, desencadeada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público Estadual de São Paulo nas últimas semanas e que prendeu 70 homens e cinco mulheres em 14 estados, incluindo Mato Grosso do Sul. Por aqui, conforme revelou o Correio do Estado, a ação desvendou a execução de Leoni de Moura Custódio, 18 anos, em setembro do ano passado, além de mostrar as primeiras versões na íntegra do novo código de conduta da facção, com punições estabelecidas, foram apreendidas em cidades como Ponta Porã, Três Lagoas e Campo Grande.

Na acusação formalizada pelo promotor Lincoln Gakiya, com mais de 600 páginas, a qual a reportagem teve acesso, é mostrado um raio-x da atuação do PCC em cada um dos estados que tiveram cumpridos mandados. Mato Grosso do Sul, considerado posição estratégica pela alta cúpula da facção e um dos pontos cruciais de conflitos com quadrilhas rivais, como o Comando Vermelho, tem cerca de 2,5 mil dos quase 20,4 mil integrantes rastreados em todos o Brasil, exceto São Paulo, local de origem do bando, com mais de 10 mil integrantes ativos.

Gakiya esclarece que os números podem sim ser maiores. Mas foram calculados com base em planilhas de pagamento da mensalidade de R$ 950 para os filiados que estão em liberdade, além de anotações sobre contatos em todos os presídios onde as autoridades rastrearam movimentações em grampos telefônicos e cartas onde o PCC é citado.

CRESCIMENTO

Os dados do MPE paulista evidenciam o reforço na estrutura do PCC no Estado após a guerra de facções no início de 2017 e as trocas de lideranças na cúpula no início deste ano. Segundo os dados vindos de São Paulo, em maio do último ano a inteligência trabalhava com um número de 1,1 mil integrantes ativos da facção em Mato Grosso do Sul, a maioria nas fronteiras e principais presídios, como a Máxima de Campo Grande e a Estadual de Dourados.

"Parece evidente que a estrutura precisou ser reforçada em meio ao cenário de crise financeira e institucional pela qual passou a organização criminosa no decorrer do período desde 2016", escreveu Gakiya.

O mesmo reflexo de aumento é visto em outros estados cruciais para o tráfico, como o Paraná e o Nordeste, onde o PCC enfrenta a resistência de adeptos dos rivais como os comandos vermelhos regionais e a Família do Norte (FDN). O novo código de conduta evidencia a necessidade de mudança do bando paulista para se tornar mais atraente aos criminosos desses locais, como o fim de execuções sumárias em presídios por motivos poucos concretos.

ATRATIVO

Em Mato Grosso do Sul, o PCC nunca enfrentou resistência para se impor. Oficialmente, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pùblica (Sejusp) não divulga dados de suas investigações sobre o rastreamento do número de filiados. Mas no início do ano passado, em meio à crise causada pela guerra de facções (com chacinas registradas em cadeias de Amazonas, Roraima e Maranhão, ao menos), o então diretor-presidente da Agência Estadual de Administração Penitenciária (Agepen), Airton Stropa Júnior, revelou levantamento que indicava um número de até 6 mil detentos do sistema sul-mato-grossense como filiados, simpatizantes ou funcionários da facção. Ou seja, 40% do total da massa carcerária do Estado.

A quantidade é expressiva, considerando o surgimento da facção no Estado, no final dos anos 1990, com a transferência pelo governo de São Paulo de alguns dos líderes na época, em um acordo entre as administrações. Em 2001, ano da primeira grande rebelião de ordem nacional instaurada pelo PCC, eram cerca de 200 integrantes, meros negociantes de drogas e armas. O tempo passou e a hegemonia foi consolidada com a execução de Jorge Rafaat Toumani, em 2016, no desfecho de um clima hostil e guerra velada que vinham há oito anos, desde o racha com o Comando Vermelho e o início do tráfico de armas sem a autorização do comerciante turco, então chefão da fronteira.

Professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, ex-subsecretário Nacional de Segurança Pública e pesquisador de crime organizado, Guaracy Mingardi estudou a forma como quadros importantes da facção paulista implantaram a cultura e o modo de atuação do PCC de forma ampla e irrestrita.

“Diferente de outros estados, em Mato Grosso do Sul era benéfico uma aliança com o PCC, afinal suas regras disciplinaram as relações nos presídios, com o fim do estupro, por exemplo, além dos benefícios às famílias e as justificativas e aprovações prévias para os assassinatos. Acabou a pistolagem”, disse o especialista.