Geral
20/11/2012 08:29:22
Mulheres negras são maioria entre jovens que não trabalham nem estudam
Mulheres negras, pardas e indígenas são a maioria entre os 5,3 milhões de jovens de 18 a 25 anos que não trabalham nem estudam no país, a chamada geração nem nem.
Agência Brasil/LD
\n \n Mulheres negras, pardas e indígenas são a maioria entre os 5,3\n milhões de jovens de 18 a 25 anos que não trabalham nem estudam no país, a\n chamada geração nem nem. Cruzamento de dados inédito feito pelo Instituto de\n Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro\n (Uerj), a pedido da Agência Brasil, revela que elas somam 2,2 milhões, ou seja,\n 41,5% desse grupo. Do total de jovens brasileiros nessa faixa etária (27,3\n milhões), as negras e indígenas representam 8% - enquanto as brancas na mesma\n situação chegam a 5% (1,3 milhão).\n \n Para o coordenador do levantamento, Adalberto Cardoso, que fez a\n pesquisa com base nos dados do Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia\n e Estatística (IBGE), várias razões explicam o abandono da educação formal e do\n mercado de trabalho por jovens. Entre elas, o casamento e a necessidade de\n começar a trabalhar cedo para sustentar a família. Cerca de 70% dos jovens nem\n nem estão entre os 40% mais pobres do país. A gravidez precoce é o principal\n motivo do abandono, uma vez que mais da metade das jovens nessa situação têm\n filhos.\n \n É o caso de Elma Luiza Celestina, 24 anos, moradora da Estrutural,\n na periferia de Brasília. A jovem deixou de estudar aos 16 anos, com o\n nascimento do primeiro filho. Ela continuou frequentando as aulas até terminar\n o 6o ano do ensino fundamental, mas engravidou novamente meses depois. Com\n isso, precisou adiar a volta às salas de aula. Desde então, dedica-se quase\n exclusivamente aos filhos, conseguindo, raramente, alguns bicos como faxineira.\n Há sete meses, no entanto, quando o terceiro filho nasceu, não assume nenhum\n compromisso profissional e vive com dificuldade financeira.\n \n Como só tenho o 6º ano, não conseguia coisa muito boa, que\n ganhasse um bom dinheiro. Era mais para fazer faxina mesmo. Mas, agora, não\n tenho como [trabalhar]. Com três filhos é difícil sair para fazer qualquer\n coisa.\n \n Elma vive apenas com a ajuda da mãe, 57 anos, para sustentar as\n três crianças. Os dois ex-maridos estão presos e não podem reforçar a renda da\n casa. O problema é que agora ela [minha mãe] também não está podendo\n trabalhar, porque está com problema no joelho. E, sem a ajuda dos pais das\n crianças, está bem difícil, conta a jovem que não consegue fazer planos para o\n futuro.\n \n Se eu quiser coisa melhor, tenho que voltar a estudar, mas não\n sei se vou conseguir, porque com esses filhos todos como vou fazer?, disse. Ela\n acredita que engravidou cedo por falta de orientação familiar. Minha mãe não\n sabe nem escrever, não tinha como me orientar. Eu acabei engravidando, não me\n cuidei e engravidei de novo.\n \n A gravidez na adolescência também levou Lucineide Apolinário a abandonar\n os estudos. Aos 25 anos, a moradora da Estrutural está grávida do quarto filho\n e, sem ter com quem deixar as crianças, desistiu de trabalhar. O atual marido,\n que é pai apenas do bebê que ainda vai nascer, é ajudante de obras e, mesmo sem\n ter emprego fixo, assume sozinho as despesas da casa. O primeiro marido morreu\n há cerca de dois anos. A jovem cursou até a 7º ano do ensino fundamental e\n lamenta o casamento e a gravidez precoces.\n \n Parei de estudar por causa das crianças. Casei aos 15 anos,\n arrumei filho muito cedo e veio um atrás do outro. Estava apaixonada, era\n ilusão de adolescente. O problema é que sobra muito para a mulher. A gente tem\n que se dividir em mil para dar conta dos filhos e da casa e não consegue pensar\n na gente, diz.\n \n Enquanto se prepara para dar à luz a mais um menino nos próximos\n dias, Lucineide diz que sonha em retomar os estudos algum dia. Ela espera que\n os filhos tenham uma história diferente da sua.\n \n Ainda vai demorar um pouco, mas algum dia eu volto a estudar.\n Para conseguir um emprego melhor tem que estar pelo menos no 1º ano [do ensino\n médio] e eu quero voltar a trabalhar para poder dar um futuro melhor para os\n meus filhos, uma história bem diferente da minha, diz.\n \n Moradora do Morro do Juramento, na zona norte do Rio de Janeiro,\n Jéssica Regina Martelo, 22 anos, parou de estudar no 6º ano, quando passou a\n achar a escola menos interessante do que a vida real. A jovem conta que era\n chato ir à escola e que preferia ficar com as amigas. Órfã de pai e mãe, ela\n foi criada pelas irmãs e teve a primeira filha aos 17 anos. Envolvido com o\n tráfico, o companheiro morreu assassinado logo depois do nascimento da menina.\n Como não pôde contar com o apoio do pai da criança, acabou tendo que trabalhar\n para se sustentar. \n \n Aos 19 anos, Jéssica teve a segunda filha, da união com Jony\n Felipe Coli, 24 anos, que também não estuda e já tinha dois filhos ao\n conhecê-la. Ele também não tem emprego formal tampouco estuda, embora cuide dos\n filhos do relacionamento anterior e que agora fazem parte da nova família. Para\n sustentar a casa, Jéssica faz bico. Prefiro ser manicure por conta própria\n porque tenho mais tempo para cuidar das meninas e o dinheiro fica comigo e com\n elas, não com o salão.\n \n Além da gravidez, outro fator de peso para o abandono da escola,\n segundo o pesquisador da Uerj, é a falta de perspectiva de vida de jovens\n pretos, pardos e indígenas, maioria nas escolas públicas, em geral, de menor\n qualidade. Ele acredita que o estímulo à educação é fundamental para mudar a\n realidade desse grupo.\n \n Uma coisa perversa no sistema educacional do Brasil é o fato de\n pessoas deixarem a escola porque não têm a perspectiva de chegar ao ensino\n superior, diz. As ações afirmativas são importantes por isso. Têm o efeito de\n alimentar aspirações de pessoas que viam a universidade como uma barreira, mas\n que vão se sentir estimuladas a permanecer no ensino, destaca.\n \n Ao analisar os dados do levantamento, a professora da Universidade\n Federal da Bahia (UFBA) Rosângela Araújo diz que é preciso entender o que está\n por trás do comportamento das meninas. Não é falta de informação. Tenho\n certeza de que a maioria conhece um preservativo. Mas tem uma questão da\n mudança de status, de menina para mulher. Elas podem não ver [o abandono\n escolar] como um passo atrás, mas no futuro, pode pesar.\n \n Segundo o levantamento, embora a taxa de jovens da geração nem\n nem no Brasil seja considerada alta (19,5% do total de pessoas de 18 a 25\n anos), o índice não está distante do verificado em países com características\n demográficas semelhantes onde é comum que a mulher deixe de trabalhar e estudar\n para se casar. É o caso da Turquia e do México, segundo estudos da Organização\n para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), citados pelo\n pesquisador da Uerj.\n \n A pesquisa também identificou entre os nem nem jovens com\n deficiência física grave e os que saíram da faculdade, mas ainda não estão\n empregados. Os dados completos constam do estudo Juventude, Desigualdade e o\n Futuro do Rio de Janeiro, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado\n do Rio de Janeiro (Faperj) e deve ter um capítulo publicado em 2013. \n \n \n \n \n