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O sistema carcerário de Mato Grosso do Sul segue a tendência nacional, onde a cada três pessoas presas, duas são pretas ou pardas, aponta o mestre em Sociologia e pesquisador do Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos (Gevac) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Raphael de Almeida Silva.
De acordo com dados da Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), das 20,3 mil pessoas privadas de liberdade em MS, 69,86% é composta por pretos e pardos.
Em números absolutos, 11.993 pessoas são pardas e 2.247 são pretas.
“Por conta do racismo estrutural que marca a sociedade brasileira e a vulnerabilização social da população negra e indígena, as políticas de criminalização atingem sobretudo esses grupos, orientadas pela seletividade racial e territorial que marca desde o olhar da polícia na hora do flagrante e da prisão ao olhar dos magistrados na aplicação da pena”, destaca o pesquisador.
Conforme Silva, Mato Grosso do Sul também conta com a maior quantidade de pessoas indígenas encarceradas. Segundo os dados da Agepen, MS possui 135 indígenas da etnia guarani privados de liberdade, 14 apenados da etnia kadiwéu, 206 da etnia kaiowá e 100 da etnia terena.
O pesquisador Raphael de Almeida Silva destaca que para compreender o caso do encarceramento sul-mato-grossense e a composição racial da população prisional, em síntese, é necessário destacar três fatores: a própria formação do Estado de Mato Grosso do Sul; a ausência e/ou a baixa capilaridade de políticas de reparação; as ações afirmativas em MS; e a guerra às drogas.
Para o mestre e doutorando em Direito Penal, advogado criminalista e secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MS), Luiz Renê Gonçalves do Amaral, o Brasil possuí um inegável débito histórico com pretos e pardos, os quais foram trazidos a própria sorte e sem nenhum auxílio do Estado a este País.
“Tal realidade, aliada a reiteradas políticas econômicas que resultaram na concentração de renda, trouxe o cenário racial atual de nossos presídios, onde aproximadamente 67% da população carcerária no País são de negros e pardos”, afirmou Amaral.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, o que se vê no Brasil é a intensificação do encarceramento de negros e jovens: 46,4% dos presos têm entre 18 e 29 anos e 67,5% são de cor/raça negra.
Em âmbito nacional ao longo dos últimos anos, o porcentual da população negra encarcerada tem aumentado. Se em 2011, 60,3% das pessoas privadas de liberdade eram negras e 36,6% brancas, em 2021, a proporção foi de 67,5% de presos negros para 29,0% de brancos.
raça propriamente dita, mas, sim, em razão da condição socioeconômica.
“De fato, o encarceramento de pobres e de pouco estudo é muito mais prevalente. Em síntese, prende-se mais pessoas pobres, sendo certo que muitos dos pobres são negros”, afirma o defensor público.
NEGAÇÃO Para o mestre em Sociologia e pesquisador do Gevac da UFSCar Raphael de Almeida Silva, o Brasil ainda se encontra no campo da negação quanto à responsabilidade pela desigualdade racial.
“A crença em uma suposta meritocracia tem por objetivo mascarar as diferenças entre os pontos de partida de pessoas negras e pessoas brancas, especialmente quanto às condições de vida. A ideia do ‘quem quer, consegue’ responsabiliza individualmente por sucessos e fracassos e ignora a necessidade de políticas públicas”, reiterou o pesquisador.
Para reverter o aumento de pessoas pretas e pardas privadas de liberdade é necessário reconhecimento da desigualdade racial, para que, a partir disso, sejam produzidas políticas de reparação eficazes, aponta Raphael.
“Medidas como cotas raciais e demais ações afirmativas são importantes e fundamentais, mas devem ser acompanhadas de outras que garantam o pleno acesso aos direitos sociais e efetiva cidadania às pessoas negras”, finalizou Almeida.
Saiba: Dados do Depen apontam que Mato Grosso do Sul está em 11º lugar no ranking de maiores despesas mensais com pessoas privadas de liberdade, entre todas as unidades da federação. Em média, uma pessoa privada de liberdade gera o custo de R$ 2 mil por mês, três vezes mais que um estudante de MS.